Naquele dia, o caminho da sala até o quarto nunca pareceu tão longo. A escada nunca teve tantos degraus. O tempo nunca passou tão devagar. Havia ali, no ar, qualquer coisa. Qualquer coisa diferente no olhar dele. Qualquer coisa diferente naquelas mãos, frias. Qualquer coisa diferente no jeito como ele se sentou na beradinha da cama, como se ele estivesse numa casa estranha e por respeito não se espalhou por ela. O tom de voz que ele escolheu, eu diria que foi, no mínimo apropriado, algo que lembre aquelas cenas dos filmes de suspense, quando a gente sabe que a qualquer momento a gente vai levar um susto. Era aquela voz, a mesma voz que ele usou pra me dizer que sem querer quebrou o vaso que a minha mãe havia me dado, e que, por coincidência, ele sempre achou um horror. Sentei naquela cama e sentia meu coração batendo frenéticamente a uns 200 batimentos por minuto. Segurei sua mão e o encarei. Ele levantou a cabeça, mas não conseguia me olhar, olhou o tempo todo para o meu pé, mais especificamente pra pantufa de zebra que ele me deu no meu aniversário e que eu usava só pra agradá-lo, já que me sentia num safári quando estava com elas. Apertei com força sua mão e disse que não precisava ter medo e que podia me contar o que fosse. Quando ele disse as primeiras frases “Eu não te amo mais.”, ”Eu estou saindo de casa”, “Eu amo outra pessoa”. Senti como se um cavalo tivesse dado um coice no meu estômago e depois sapateado em cima mim. Perguntei como era possível, assim do nada, ele deixar de me amar? Não haviam aparecido ainda os tais ‘sintomas do fim da relação’ que minhas amigas sempre me falaram: nada de rotina, nem tédio, ele nunca nem falou mal da minha mãe, não reclamou que eu tava ficando gorda ou feia ou velha, nunca falou que minha comida era uma gororoba, apesar de ser uma gororoba. Como de uma hora pra outra ele simplesmente vira pra mim e diz que não me ama mais? Ele não se defendeu nem se explicou, apenas levantou-se, tirou a mala já pronta debaixo da cama. Sim meus caros, a mala já estava ali pronta, filho da puta, então foi tudo premeditado, tudo friamente calculado. Ele saiu, não olhou pra trás nem pra conferir se eu tava tendo um ataque cardíaco, ou se eu tava pegando uma arma na gaveta da cômoda. Nada. Virou as cotas e saiu. Fiquei ali sentada por horas. Chorei até ficar sem lágrimas. Me perguntando o por que. Estávamos juntos havia muito tempo, um tempo suficiente para sabermos que era pra sempre, não pensavamos em casamento, dizíamos que seriamos eternos namorados. Eu sabia de cor, cada mania, cada gesto, cada ruga do seu belo rosto, sabia de todas as cicatrizes, dos seus gostos mais exóticos. Tudo. Éramos felizes. EU era feliz. ELE não.
Marina Borges
Excelente conto, espero que não seja verídico.
ResponderExcluirBem, qualquer coisa eu estarei em meu blog (http://jefhcardoso.blogspot.com), onde falei sobre os dois dias que nos resta de vida.
Abraço do Jefhcardoso.
que droga, escrevi um comentário gigante, e apagou, sem graça...mas amei o conto, amei, sua caio.
ResponderExcluirque lindo, que triste, mas que lindo!!!
ResponderExcluirhttp://uivoeaurora.blogspot.com
ResponderExcluirescolhe lá os teus, ehauiheuiahueiauhe